DA EXPLOSÃO JUVENIL (YOUTH BULGE) E A POSSIBILIDADE DO DIVIDENDO DEMOGRÁFICO



DA EXPLOSÃO JUVENIL (YOUTH BULGE) E A POSSIBILIDADE DO DIVIDENDO DEMOGRÁFICO
Por: Egidio Vaz

Originial em: https://web.facebook.com/photo.php?fbid=2715789795315514&set=a.1400830150144825&type=3

Comecemos pelos conceitos, para nos entender e melhor enquadramento.

YOUTH BULGE (explosão juvenil, tradução literal) é um fenômeno comum em muitos países em desenvolvimento e, em particular, nos países menos desenvolvidos. É geralmente devido a um estágio de desenvolvimento em que um país alcança sucesso na redução da mortalidade infantil bem como altas taxas de fertilidade. YOUTH BULGE refere-se a um padrão demográfico onde grande parte da população é composta por crianças e jovens adultos. Tal é o caso de Moçambique, cuja maioria da juventude ainda se encontra EM IDADE DE ESPERA (para compreender o conceito, veja o meu post anterior QUEM É JOVEM EM MOÇAMBIQUE? Contribuição para um diálogo com o Secretário do Estado para Juventude e Emprego de Moçambique: https://web.facebook.com/egidiovaz/posts/2712256795668814 de 21 de fevereiro de 2020).

DIVIDENDO DEMOGRÁFICO é o potencial de crescimento econômico que resulta de mudanças na estrutura etária de uma população, principalmente quando a parcela da população em idade ativa é maior que a parcela da população em idade não ativa (velhos e crianças, juntos).

IDADE DE ESPERA é um prolongado estado de “juventude” caracterizado por sérias dificuldades de estes acederem ao estatuto social de “adulto”.

Como tenho dito, em Moçambique já não nascem bebés feios. Com o cada alargamento dos serviços materno-infantis como consultas pré-natais, vacinação; com o alargamento de serviços de saúde sofisticados aos distritos, postos administrativos; com a melhoria das condições de vida, segurança alimentar e a educação tanto de crianças como de adultos, a mortalidade infantil está a baixar; a taxa de fertilidade está em alta. Os jovens, mesmo desempregados ou subempregados não têm preguiça em engravidar; a libido está em alta. Como que a corroborar, a pirâmide etária de Moçambique é JOVEM: base larga, devido à elevada natalidade e topo estreito em consequência de uma elevada mortalidade e esperança média de vida reduzida. Essas características configuram ao que Justin Yifu Lin, antigo economista-chefe do Banco Mundial e vice-presidente sénior chama por YOUTH BULGE ou em português literal, Explosão Juvenil. É o que nos caracteriza como população, à semelhança dos outros países em desenvolvimento.

Em alguns países, a explosão juvenil criou bomba-relógios que, rebentados, resultaram em CONFLITO CIVIS. Aliás, existe uma literatura que correlaciona a onda de protestos na região do MENA - Middle East, North Africa (Médio Oriente e África do Norte; acrónimo inglês) com a explosão juvenil, um pouco na linha do que Alcinda Honwana descreve como sendo a consequência da idade de espera (WAITHOOD), que criam esses CONFLITOS CIVIS. Mas, casos há onde a explosão demográfica foi otimizada, resultando no DIVIDENDO DEMOGRÁFICO. Bangladesh e China são disso, o exemplo paradigmático. São cenários extremos que acredito não estamos ainda a caminhar para o pior cenário (CONFLITOS CIVIS), pois nos encontramos ainda na ressaca da independência, na construção da paz e no fortalecimento das instituições do estado, enfim, na formação e consolidação da nação moçambicana; não estamos ainda desenraizados das narrativas pós-independência ao mesmo tempo que procuramos o múnus da paz e reconciliação nacional. Ou seja, ainda vamos a tempo de corrigir completamente o cenário a favor do DIVIDENDO DEMOGRÁFICO.

DESEMPREGADOS E SEM PODER
A descrição exata do que pode ser a juventude Moçambicana hoje é esta: desempregados e sem poder. Este cenário é caraterizado pelo desvanecimento das expectativas de um mundo melhor à medida que não são alcançadas; mudança ou mesmo o fim de empregos tradicionais devido à automação; um sistema de ensino que insiste em educar jovens para empregos em extinção ou que já não existem e um sistema político gerontocrata (Inayatullah, 2016).

Neste cenário, é provável que os jovens se rebelem ou recorram a mais seriamente à armas cibernéticas À medida que a sociedade se torna muito mais sofisticada tecnologicamente - a Internet das coisas, pessoas e dados - a guerra cibernética se torna no caminho fundamental para a rebelião. O caso Moçambicano serve-nos do alerta para o que exatamente deve ser abordado. Notei nestes dias que o respeito pelos idosos não está a ser norma, principalmente aos idosos que outrora foram dirigentes. A máxima “respeitar os idosos”, está sendo substituída por “o único velho bom é um velho morto”. Essa mudança ocorre à medida que os idosos utilizam os recursos de saúde para viverem mais e mais, reduzindo não apenas as opções políticas e econômicas dos jovens, mas também suas opções de saúde (cf: Inayatullah, 2016, p.28).

VIRTUALMENTE ENTRETIDOS E RETIRADOS
Um subproduto do cenário anterior é de termos uma juventude que, apesar de ser maioritariamente desempregada e sem poder também recorra aos que se conhece por CÂMARAS DE ECO (ECHO CHAMBERS), ambiente onde encontra apenas crenças ou opiniões que coincidem com a suas, para reforçar as suas visões e descartar as outras. Este ambiente é o das redes sociais, que alberga um exército de jovens reformados que diariamente praticam a eutanásia intelectual e a folia do ciberativismo que os arrasta para o interior de sonhos inimagináveis. Enquanto isso, um outro e grande enclave vegeta na agricultura de subsistência, a espera do resgate para uma possível MOBILIDADE SOCIAL.

TIRAR PROVEITO DO DIVIDENDO DEMOGRÁFICO OU DO YOUTH BULGE

Como fazer da explosão juvenil um dividendo demográfico? Países como China, Bangladesh, Koreia do Sul conseguiram. Para o caso da China, desde o início de reformas econômicas no final de 1970, conseguiu gerar milhões de novos empregos e tendo ao mesmo tempo, transferido jovens trabalhadores de atividades agrícolas de baixa renda para o setor manufatureiro de alta renda sem experimentar altos níveis de desemprego (Lin, 2012). Educar a juventude para empregos de futuro parece-nos ser um outro caminho razoável. O advento da automação e da sofisticação dos meios de produção colocam em risco milhares de empregos tradicionais. Pensemos, por exemplo da profissão do datilógrafo; do telefonista; do latoeiro, etc. são, na sua maioria, não apenas empregos em extinção como são também empregos muito mal pagos e que só servem para reproduzir o ciclo da pobreza. Os jovens adaptam-se rapidamente a novas tecnologias já impregnadas nas novas estruturas produtivas da economia global. As instituições educacionais devem se adaptar para educar e formar os jovens para os empregos de amanhã.

O Relatório Mundial de Desenvolvimento de 2007 enfatiza a necessidade de melhoria das habilidades profissionais dos jovens bem como do cenário institucional como mecanismos para melhorar os resultados econômicos dos jovens. Todavia, esta abordagem está centrada na oferta-tudo o que o Estado pode fazer para preparar os jovens para o mercado de emprego. Todavia, Lin sugere o contrário ou, no mínimo, olhar também para o lado da demanda, ou seja, criar oportunidades reais e imediatas para que os jovens tenham emprego apostando em projetos que exijam mão-de-obra intensiva como a indústria e a manufatura. Também é de extrema importância a aposta nas tecnologias de informação pois elas são a janela para o empreendedorismo. Bangladesh, com 164.7 milhões de habitantes, possui 600 mil freelancers em IT. Se os americanos possuem Sillicon Valley, os quenianos possuem a Silicon Savannah; os indianos têm a sua Bangalore. E Moçambique? Parque Industrial da Maluana? Estarão as instituições a dialogar? Microfinanças é outro mecanismo que pode ajudar não apenas a dita inclusão financeira, mas também o desenvolvimento de iniciativas empreendedoras que, com devida mentoria pode rapidamente absorver grande parte dos jovens para o mercado formal de emprego. Que o diga Muhammad Yunus, o empreendedor social que ajudou a tirar milhares de homens e mulheres da pobreza em Bangladesh. E por final, o ambiente de negócios precisa ser favorável aos novatos para permitir que os jovens se tornem empreendedores tecnológicos, sociais e econômicos.

É fácil apontar problemas. Ou melhor, descrevê-los. Mas, como sempre acreditei, problemas bem identificados podem constituir meio-caminho andado para a solução. Estou seguro de que urge um debate bem informado sobre como tornar real o manifesto do Partido vencedor e as promessas eleitorais inerentes ao emprego e juventude.

PS: Aos interessados em aprofundar o debate podem ler as seguintes referências:

Inayatullah, S. (2016). Youth bulge: Demographic dividend, time bomb, and other futures . Journal of Futures Studies, 21(2), 21-34.

Lin, J. Y. (2012, January 5). Youth Bulge: A Demographic Dividend or a Demographic Bomb in Developing Countries? Retrieved February 25, 2020, from https://blogs.worldbank.org/…/youth-bulge-a-demographic-div…

Vaz, E (2020). QUEM É JOVEM EM MOÇAMBIQUE? Contribuição para um diálogo com o Secretário do Estado para Juventude e Emprego de Moçambique : Facebook: https://web.facebook.com/egidiovaz/posts/2712256795668814 de 21 de fevereiro de 2020

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